Colaboração digital para uma força de trabalho de manufatura conectada

Muitos especialistas previram que, com a chegada da Quarta Revolução Industrial (4IR, na sigla em inglês), a automação e as tecnologias avançadas substituiriam rapidamente empregos e trabalhadores fabris no mundo todo.

Até o momento, essa previsão não se concretizou. De fato, nossa pesquisa com o Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês) revela que as fábricas líderes (conhecidas como “Faróis”) vêm fazendo investimentos substanciais em pessoas. E a importância das pessoas só faz aumentar enquanto a pandemia de COVID-19 se espalha pelo planeta.

A necessidade de complementar os trabalhadores com tecnologia decorre, em parte, de quatro grandes tendências que estão transformando o panorama da manufatura: a aposentadoria da geração nascida no pós-guerra, a regionalização, a proliferação dos dados de chão de fábrica e, agora, a COVID-19. Essas tendências estão gerando uma força de trabalho mais espalhada, menos experiente e mais sobrecarregada de dados com potencial inexplorado.

Portanto, os fabricantes precisam de ferramentas que ajudem seus trabalhadores a colaborar entre si e a se manter conectados em diferentes regiões e funções – sobretudo com a consolidação do distanciamento físico e das medidas mais rígidas de segurança dos funcionários. As ferramentas de colaboração digital estão prontas para desempenhar um papel decisivo em termos de permitirem que os funcionários utilizem o conhecimento coletivo da empresa, resolvam problemas remotamente com especialistas e transformem em valor duradouro os dados da Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês) provenientes do chão de fábrica.

Estimamos que a colaboração digital tenha o potencial de liberar mais de $ 100 bilhões em valor – devido, em parte, a aumentos de produtividade de 20% a 30% nos processos de trabalho que demandam muita colaboração, como investigação de causas-raiz, gestão de fornecedores e manutenção.

O panorama da manufatura está mudando

O envelhecimento da força de trabalho, a regionalização e a proliferação dos dados estão alterando a composição da força de trabalho de manufatura e a maneira pela qual o trabalho é executado – sendo que o surto de COVID-19 reforça alguns desses efeitos. Como consequência, os fabricantes enfrentam o imperativo urgente de ajudar os trabalhadores menos experientes a desenvolver conhecimentos e capacidades e a tirar proveito dos dados por meio da colaboração.

Força de trabalho em processo de envelhecimento. Em 2019, a Associação Nacional de Fabricantes (National Association of Manufacturers) dos Estados Unidos estimou que um quarto da força de trabalho de manufatura norte-americana tinha 55 anos de idade ou mais. Assim, não é de surpreender que uma das maiores preocupações entre os fabricantes norte-americanos seja a “fuga de cérebros”, sendo que 97% das empresas manifestaram alguma preocupação com isso. Para evitar essa perda de conhecimento institucional à medida que os trabalhadores envelhecem e se aposentam, os fabricantes vêm intensificando as iniciativas de codificação dos conhecimentos, a fim de que possam ser transmitidos de maneira mais eficiente e eficaz à próxima geração de funcionários.

Ao mesmo tempo, os fabricantes também têm relatado dificuldade para recrutar e reter trabalhadores qualificados, já que os recém-formados parecem mais inclinados a trabalhar em empresas com um foco digital mais evidente. Não está claro se a situação econômica um tanto distinta que empresas e trabalhadores enfrentam agora fará uma diferença prolongada na contratação. No entanto, não deixa de ser verdade que esses trabalhadores jovens não contam com o mesmo conjunto de habilidades que as gerações anteriores e não foram expostos aos mesmos programas de treinamento e aprendizagem. Os fabricantes podem passar a ser atraentes para essa nova geração de trabalhadores se promoverem treinamentos e os ajudarem a aprender. As ferramentas de colaboração permitem que as fábricas aproveitem melhor seus especialistas em um grupo mais amplo de pessoas para ajudar a treinar a força de trabalho menos experiente.

Regionalização. Nos últimos anos, as zonas fabris tradicionais no exterior vinham ficando menos atraentes com o aumento dos custos de transporte e dos salários. Em reação a isso, os fabricantes já estavam começando a alterar a localização das fábricas, fosse fazendo “nextshoring” para ficarem perto do cliente nos mercados desenvolvidos, fosse mudando para outras regiões, como os países do MINT (México, Indonésia, Nigéria e Turquia). Se a regionalização continuar dispersando a força de trabalho e alterando a presença das fábricas – como parece ser possível, em reação à pandemia –, os fabricantes precisarão de maneiras novas e melhores de compartilhar aprendizados em diferentes regiões geográficas.

Proliferação dos dados. Na última década, a conectividade das máquinas nas fábricas cresceu exponencialmente, gerando enormes quantidades de dados novos e enriquecidos. Contudo, muitos fabricantes foram desafiados a ajudar seus funcionários a usar os dados ao máximo para a resolução de problemas e a tomada de melhores decisões. As ferramentas que conectam trabalhadores a outros trabalhadores e a dados ajudarão os fabricantes a transformar os dados em ações que geram valor real: imagine um operador que queira solucionar problemas em um equipamento e possa compartilhar dados da máquina em tempo real com um especialista remoto para obter uma orientação precisa.

COVID-19. A pandemia de COVID-19 resultou em importantes ajustes nas maneiras de trabalhar e nos modelos de alocação de pessoal em fábricas do mundo todo. O distanciamento físico, as questões de segurança do trabalhador (e do cliente) e a realidade econômica que as empresas enfrentam agora terão um impacto duradouro, mesmo no mundo pós-COVID-19. Podem ser necessárias alterações estruturais duradouras em processos de trabalho fundamentais, como mudanças de turnos, reuniões diárias e investigações de causas-raiz, a fim de minimizar o contato físico entre os trabalhadores fabris e mitigar os riscos. Assim, os fabricantes estão buscando maneiras inovadoras de ajudar esses trabalhadores a interagir virtualmente, ao mesmo tempo que mantêm (ou até aumentam) a produtividade.

Incorporação da colaboração digital aos fluxos de trabalho

Até agora, as tecnologias de colaboração disponíveis para a maioria dos funcionários estavam limitadas a ferramentas básicas de comunicação, como e-mail, bate-papo e mensagens de texto. Essas ferramentas costumam estar desconectadas dos fluxos de informações relacionados aos processos empresariais, o que resulta em um vaivém de atualizações de status e complexas transferências de tarefas, que diminuem a produtividade dos funcionários.

A incorporação da colaboração digital aos fluxos de trabalho dos processos pode permitir decisões melhores e mais rápidas, que melhoram os indicadores-chave de desempenho (KPIs, na sigla em inglês) e contribuem para os resultados financeiros, como mostra o Quadro 1.

Quadro 1

Para entender melhor como a colaboração pode ser usada para reformular uma série de processos empresariais, exploramos dois exemplos com intensidades de colaboração diferentes: investigação de causas-raiz e manutenção. Descobrimos que o maior potencial de valor reside em processos que envolvem um grande número de cargos e interações diárias entre os cargos (Quadro 2).

Quadro 2

Reforma das investigações de causas-raiz

Em uma unidade fabril, a causa real de um problema de produção pode, geralmente, ser rastreada até uma série de eventos que causaram esse problema – processo denominado “solução de problemas de causa-raiz” ou “investigação de causa-raiz”. À medida que a investigação de um problema específico prossegue, ela costuma exigir um nível de expertise mais alto; assim, as partes e os cargos pertinentes envolvidos mudam de forma contínua – o que torna a investigação intensamente colaborativa. Entre os tópicos que costumam ser investigados estão problemas de segurança e manutenção (falhas de máquinas, grandes avarias), problemas de qualidade (como sucata e retrabalho) e problemas técnicos (desempenho do produto, variações nos materiais).

Por exemplo, um fabricante de eletrônicos pode constatar que sua linha de produção está gerando sucata em demasia – desperdício que se acumula ao longo do tempo, gerando custos significativos. Em um nível alto, um processo de investigação de causas-raiz provavelmente envolveria até nove etapas principais, desde capturar e codificar os problemas até analisar dados, iniciar e conduzir uma investigação detalhada, identificar e implementar soluções e, por fim, avaliar a eficácia, além de codificar e compartilhar melhores práticas.

Solucionar a má coordenação acelera a resolução de problemas

Em cada etapa, surgem pontos problemáticos devido à falta de conectividade entre os trabalhadores e entre trabalhadores e dados. Encontrar uma solução para um problema geralmente requer múltiplas iterações entre vários cargos específicos – e pode levar até 90 dias do início ao fim.

Apenas uma etapa, a investigação mais profunda, ilustra essas questões. A identificação dos especialistas e a coordenação das agendas podem causar atrasos de semanas e gerar custos crescentes para levar as pessoas certas a um local determinado. Uma captura de dados ineficaz pode resultar em perda de tempo para diversas pessoas durante uma sessão de resolução de problemas. Uma coordenação inadequada pode resultar em atividades redundantes ou na incapacidade de tirar proveito de soluções desenvolvidas anteriormente.

Uma melhor colaboração não apenas ajudaria as equipes a encontrar especialistas e coordenar as agendas, como também pouparia tempo e despesas ao permitir que eles usassem reuniões virtuais e buscassem rapidamente informações pertinentes. Um processo reformulado de investigação de causas-raiz usa a tecnologia para melhorar a coleta de informações, permitir a colaboração contínua e compartilhar conhecimentos entre todos os cargos envolvidos em uma investigação de causas-raiz.

Os engenheiros podem tirar e carregar fotos de problemas de produção e preencher modelos detalhando fatos importantes de serem registrados, além de acessar dados de equipamentos a partir de sensores ou ferramentas, se for o caso. O resultado é uma melhor captura e categorização dos dados. O líder da iniciativa de melhoria contínua pode facilmente pegar os dados e analisá-los para identificar os problemas de maior impacto e selecionar automaticamente um grupo de colaboradores. A partir daí, todos os colaboradores, onde quer que estejam, podem trabalhar juntos para compartilhar imagens, arquivos, insights e discussões de forma digital e simultânea. Os colaboradores podem ser alterados facilmente, à medida que a equipe principal mude para uma equipe mais especializada de técnicos. Quando o problema for finalmente solucionado, a solução documentada continuará a ajudar equipes futuras que venham a se deparar com problemas semelhantes.

O impacto de uma melhor resolução de problemas

Para um fabricante hipotético com receita de $ 10 bilhões, esses tipos de alterações podem ter implicações financeiras significativas devido a um oferta de um serviço melhor e de custos mais baixos.

Níveis de serviço mais altos. Problemas inesperados resultam em tempo de inatividade nas fábricas, o que diminui os níveis de serviço referentes ao processamento de pedidos, potencialmente reduzindo a satisfação dos clientes. Se o uso de ferramentas digitais e colaborativas melhorar o nível de serviço em 1% e diminuir o tempo de inatividade em 1%, o efeito resultante na receita é um aumento de 0,2% – ou $20 milhões.

Custo da qualidade mais baixo (taxa de sucata). Problemas de qualidade podem levar a custos substanciais para os fabricantes, na forma de sucata, retrabalho e pedidos de garantia. A identificação e resolução mais rápidas dos problemas de qualidade por meio de ferramentas de colaboração têm o potencial de diminuir a sucata em cerca de 25%, o que significa um aumento de 0,5% na receita, ou $50 milhões.

No cômputo geral, reformular o processo de investigação de causas-raiz por meio da colaboração digital pode gerar $70 milhões em receita para um fabricante com receita de $10 bilhões.

Gestão mais eficaz da manutenção

Para setores com uso intensivo de ativos em que a quantidade de capital investido é enorme e o valor da produção de um dia é alto, a manutenção de rotina para maximizar o tempo de atividade das unidades fabris é especialmente importante. Mesmo assim, os processos de trabalho de manutenção típicos ainda são manuais e baseados em papel, sendo que muitas mudanças de turno resultam em importantes perdas – ou “escape” – de informações a cada etapa.

Veja o exemplo de um fabricante da indústria pesada. Em um nível alto, o processo de manutenção – como na investigação de causas-raiz – envolve cerca de nove etapas, começando pela identificação do trabalho, sua classificação por ordem de prioridade e seu planejamento, passando à gestão, definição do cronograma e autorização de materiais e, em seguida, à execução, encerramento e, por fim, faturamento do prestador de serviços.

Os pontos problemáticos da manutenção são familiares: má documentação e mau compartilhamento de conhecimentos, comunicação ineficiente entre os stakeholders e longos tempos de espera em razão da verificação e dos cronogramas feitos de forma manual. Ademais, o processo de manutenção é ainda mais complicado do que a investigação de causas-raiz devido à necessidade de registro transparente de informações e à intensidade da coordenação necessária entre os stakeholders (tanto internos como externos) para gerenciar materiais, alocação de pessoal e cronogramas de produção.

A reformulação da colaboração simplifica o processo de manutenção

A equipe que realiza a manutenção geralmente consiste em um ou dois funcionários internos e alguns prestadores de serviços externos. Quando a equipe começa a resolver o problema em questão, costumam surgir problemas secundários. Um problema aparentemente simples em um motor de ventilador pode se transformar em uma complexa atividade de troca de cabeamento que requer que os membros da equipe voltem ao escritório, solicitem mais materiais e busquem um especialista em cabeamento – que talvez precise até vir de avião. Esse processo longo e caro pode acabar tratando um problema de manutenção que não é nem de longe tão importante para a produção quanto uma longa lista de outras tarefas de manutenção.

O processo reformulado tira proveito da tecnologia colaborativa para ajudar a reunir ordens de serviço, a classificá-las conforme a prioridade e acompanhá-las, a coordenar múltiplos stakeholders e a compartilhar conhecimento e expertise em toda a unidade fabril. Os inspetores podem verificar e coletar informações usando um modelo digital, reduzindo, assim, a papelada nas inspeções de manutenção. Os gerentes de unidades fabris podem visualizar as ordens de serviço de maneira mais abrangente, permitindo uma melhor classificação do trabalho em ordem de prioridade com base em critérios pertinentes.

Os gerentes também podem decidir facilmente quais materiais pedir e quais especialistas trazer. Somente dentro da etapa de “execução”, as ferramentas digitais podem permitir que os técnicos colaborem de maneira eficiente – em sua equipe e em toda a empresa – com especialistas pertinentes para solucionar problemas, viabilizando um acesso rápido aos especialistas, a informações e a soluções comprovadas no campo. Isso significa que equipamentos importantes ficam menos tempo inativos e que os problemas são resolvidos a custos mais baixos.

O valor gerado pelo redesenho da manutenção

Incorporar a colaboração aos processos de manutenção pode reduzir em 10% a 15% os gastos aplicáveis à manutenção (excluindo-se peças, aluguel de equipamentos e custos de prestadores de serviços). Mas os efeitos também são visíveis em outros KPIs.

Eficácia geral do equipamento (OEE, na sigla em inglês). O tempo de inatividade reduzido aumenta a OEE em 2 a 3 pontos percentuais.

Tempo efetivo de mão de obra. A quantidade de tempo que os trabalhadores passam executando tarefas de valor agregado aumenta em aproximadamente 5% a 10%.

Custo de manutenção como porcentagem do valor de reposição dos ativos (RAV, na sigla em inglês). Os gastos anuais de manutenção como porcentagem do RAV podem diminuir em cerca de 5% a 10%.

No total, para um fabricante com receita de $10 bilhões, esses resultados podem equivaler a $110 milhões em receita.

Como os fabricantes podem capturar esse valor

Para aproveitarem a oportunidade, os fabricantes podem tomar várias medidas táticas.

Mapear os processos com potencial de colaboração. O mapeamento dos processos mais importantes dentro de uma organização revela quais deles envolvem o maior custo e o maior atrito colaborativo. Em geral, apenas um pequeno subconjunto dos processos é responsável pela maior parte do custo e da complexidade.

Identificar um conjunto integrado de respostas. Entender quais alavancas acionar para diminuir o custo e a complexidade – inclusive aumentar a colaboração, melhorar a captura de dados ou eliminar o trabalho manual, entre outras. Isso se traduz em casos de uso que as soluções tecnológicas podem abordar, como facilitar o trabalho em equipe em locais distribuídos.

Detalhar o roteiro técnico. Nos principais casos de uso, identificar a tecnologia e as ferramentas necessárias para tratar os pontos problemáticos dos processos mais ineficientes e viabilizar colaboração adicional. Priorizar as ferramentas relacionadas aos objetivos estratégicos gerais, em vez de se concentrar em soluções tecnológicas “glamourosas”.

Incorporar a colaboração ao plano geral de transformação digital. Ao incorporarem processos habilitados para a colaboração digital às estratégias gerais de transformação digital e aos roteiros técnicos, as empresas podem obter uma melhor capacidade de atingir escala e podem evitar a perda de tempo com ideias que provavelmente não gerariam impacto prolongado.

Impulsionar a adoção pelos usuários e incutir uma cultura com foco digital. Promover uma cultura que enfatize a importância do digital. Incorporar sessões de treinamento frequentes para garantir que os funcionários tenham pleno entendimento de como usar a tecnologia e fiquem animados com as mudanças.


Os fabricantes têm pela frente a necessidade urgente de desencadear a próxima onda de produtividade em suas operações. Frequentemente, a pressão crescente dos custos leva as empresas a fazer tradeoffs de curto prazo que comprometem a qualidade e a confiabilidade – tentando fazer mais com uma força de trabalho menor ou de custo mais baixo. A colaboração digital oferece uma solução para isso. Ao digitalizarem processos para aprimorar a gestão dos equipamentos e otimizar os ativos físicos, as ferramentas de colaboração digital oferecem aos fabricantes maneiras de aumentar a produtividade e melhorar a qualidade. Em última análise, essas ferramentas permitem que os fabricantes concretizem a visão do “trabalhador conectado” – empoderado por um fluxo contínuo de dados em tempo real provenientes de ativos físicos. Os primeiros fabricantes que tirarem pleno proveito da colaboração digital obterão uma vantagem competitiva significativa.

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